sábado, 24 de novembro de 2007

Estás a ver?

Nunca pareceu tão perto, nunca pareceu tão perto o momento em que eu sairia deste lugar.
As árvores deixam seus frutos cairem assim como eu deixo cair minha lucidez; sem nenhuma reação. Mais uma vez meu radinho de pilha me serve de conforto. Consigo ouvir as freqüências, como se pudesse enxergar o que se passa ali dentro daquele ser inanimado,
aquele ser que funciona devido à uma frágil carga elétrica.

Assim estive durante todo o tempo em que aqui me repousei, funcionando à base de cargas elétricas e de olhares de pena e de superioridade. Há alguns anos o céu está pálido e a ferrugem parece comer a paisagem que outrora via através das grades. Parecia tudo tão calmo, um toque de Deus diante da perturbadora nação de "endemoniados". A música que tocava dizia algo sobre "o que eu penso sobre você". Comecei a pensar que eu não penso, pensei sem ao menos pensar que meus pensamentos eram pássaros, eram as grades e eram as chaves, meus pensamentos me prendiam e me libertavam; me levavam ao céu, me traziam de volta à terra.

E cá estava eu, mais uma vez sedado; mais uma vez aliviado. A tensão que aqueles sons me proporcionavam tinha acabado
e mais uma vez estava sendo chamado de louco, mais uma vez pedindo para morrer.

E os anos se foram, todos se foram. Fiquei aqui olhando o movimento. Aos sábados, o João vinha trazer mais pilhas para colocar em meu rádio. Presenciei silenciosamente a passagens de homens engravatados que queriam erguer a torre, os que queriam empilhar pedras, a fim de trazer o conforto; presenciei curiosos. De tudo um pouco. E lá estava eu, hora vestido de branco, hora vestido de azul carregando nos meus fundos olhos a imagem da aspereza do mundo.

Minha auta? Ela nunca saiu; na verdade aquele papel nunca me serviu mesmo. As chagas que o mundo me causou nunca serão reduzidas, os cabelos que perdi nunca serão recuperados, o sorriso que sorri nunca mais se abrirá. A vida que pedi...

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