segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Transição ao Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento e Partido – Atuais desde Lênin

Começo este texto dizendo que, em 1989, ano da queda do Muro de Berlim, ainda tinha dois anos, portanto, não trago lembranças dos episódios marcantes da história da luta dos povos oprimidos, da classe trabalhadora, em prol de uma sociedade socialista.  Para açodar o que digo, preciso deixar clara o quão devastadora foi a queda dos Regimes Socialistas, na Rússia e Leste Europeu. Sendo assim, proponho-me a uma análise, tendo como ponto de referência 3 artigos publicados por João Amazonas logo após esse período: A Teoria Enriquece na Luta por um Mundo Novo; Capitalismo de Estado na Transição ao Socialismo; e Força Decisiva da Revolução e da Construção do Socialismo.

Parto desses três textos para afirmar que um dos grandes legados que o líder João Amazonas deixou a todos os comunistas do Brasil foi uma profunda e perspicaz análise dos erros e acertos constituídos na tentativa de edificação da sociedade socialista no período soviético. Arrisco-me a dizer, então, ou mal resumir que, 1) a crença de que o Socialismo será construído pela vontade dos homens apenas, sem respeitar as leis objetivas da sociedade e posteriormente, 2) a falta de atualização da teoria revolucionária – coisas que se coadunam – levaram à degenerescência da experiência do socialismo real.

           Faço essa relação porque, num mundo tomado pela euforia capitalista pela derrocada do Socialismo e decepção da esquerda mundial, algumas coisas passaram longe da análise de que, como diz Amazonas, o desenvolvimento da ciência não é retilíneo e que a crise do Socialismo tem, na verdade, sua origem no revisionismo, a partir da década de 1950. Mesmo assim, com todos os problemas da construção do Socialismo na URSS, como a repressão política e ideológica; a concentração de poderes e as diferenças entre teoria e prática – gerando desafios econômicos, como desenvolver o país tecnicamente para o momento que vivia; no plano político, com a questão da democracia socialista e o modelo de estado cujo sistema jurídico-institucional deveria ser para todos os trabalhadores -, o Socialismo russo tirou o país do atraso. Para se ter ideia, em 1925, dois terços da produção do país vinha da agricultura e apenas um terço da indústria. Em dois anos a indústria elevou sua participação para 42%. Num país agrário, cuja fome assolava parcela considerável da população, a coletivização da agricultura multiplicou por 10 a produção de cereais. Alguns números são marcantes:  a média anual de crescimento industrial da URSS chegou a ser 20%, enquanto nos países capitalistas, 0,3%; o número de operários cresceu de 3,8 milhões para 10. Ou seja, o Socialismo colocou a Rússia num novo patamar.

            Os erros cometidos no curso da experiência soviética partem, em grande proporção, dos desvios na concepção marxista de partido que ocorreu em vários países da URSS. Segundo João Amazonas, a maioria dos partidos comunistas se afastou do leninismo e perdeu sua independência ideológica. Com o advento do Revisionismo, vários partidos tornaram-se partidos de reforma, aliados da burguesia, do imperialismo. Poucos resistiram e mantiveram sua independência organizativa, política e ideológica. Vários extinguiram-se ou reduziram-se a pequenos grupos inofensivos socialdemocratas. Além disso, o liberalismo foi outro fator importante na degenerescência do partido leninista, fruto de um desvio burguês, opondo-se ao centralismo democrático.

        Contudo, reconhecer e retomar conceitos trabalhados por Lênin no que concerne à transição ao Socialismo recupera o ímpeto revolucionário e fazem os comunistas reconhecerem com mais clareza e firmeza de objetivos os caminhos a serem tomados. Para combater, de um lado, o oportunismo revisionista, de outro, o esquerdismo, Lênin reconhecia que, mesmo a vanguarda “passando diretamente ao socialismo”, uma grande parcela da população não estava realizando essa transição, e que para realizá-la plenamente era preciso utilizar recursos e instrumentos intermediários para a passagem das relações pré-capitalistas ao socialismo. Por isso, formulou a teoria do Capitalismo de Estado. Portanto, com o poder político nas mãos dos trabalhadores, era preciso desenvolver o capitalismo num país atrasado como a Rússia. Para isso, Lênin formulou várias questões sobre as concessões no estado socialista; o mesmo afirmava que não havia perigo, pois “absurdo seria entregar a maioria das propriedades. Isso já não era concessão, mas um retorno ao capitalismo”. E proclamava: “Que a pequena indústria privada se desenvolva até certo grau, e que se desenvolva o capitalismo de Estado – o poder soviético não deve isso temer”.

             Para João Amazonas, essa análise acertada de Lênin parte do fato de que ”a revolução não ocorre na Idade da Pedra, mas em estágio superior do desenvolvimento da sociedade. O capitalismo atingiu parâmetros elevados na produção dos bens materiais. O socialismo não pode ficar atrás. Tem de construir algo melhor e superior ao sistema capitalista. Contudo, não reúne inicialmente as condições necessárias para isso. Tampouco poderá fazê-lo arbitrariamente, fugindo às etapas que se impõem.” Portanto, desenvolver o Capitalismo de Estado e garantir o desenvolvimento das forças produtivas é essencial para realizarmos as transições ao socialismo.

        Essas transições, para cumprirem o papel civilizacional que podem cumprir, devem ter como condutores a classe trabalhadora. Por isso, o essencial é o poder nas mãos do proletariado, sem o qual, aí sim, o Capitalismo serviria à burguesia. No Brasil, realizar as condições para uma transição a um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento é, em certa medida, retomarmos conceitos como o de Capitalismo de Estado, no qual o poder pertence aos trabalhadores e não ao Capital. Cabe, então ao Brasil, realizar essas transformações naquilo que entrava a realização plena do nosso desenvolvimento através da garantia das reformas democráticas e, principalmente, dando a “cotovelada” que precisamos dar no Capital, que diuturnamente tenta impedir o salto civilizacional de que o país precisa. Sendo assim, avançar nas mudanças, garantindo mais desenvolvimento e elegendo um projeto popular e democrático que tenha como centro de atuação o trabalho é essencial para nossa luta. Façamos avançar!







domingo, 18 de agosto de 2013

'Menas' educação, mais preconceito

As redes sociais, embora tenham seu papel de democratização e velocidade da informação indiscutíveis e dignas de estudos científicos mais aprimorados do que os comentários que eu posso fazer, são também espaços em que os preconceitos e valores distorcidos da sociedade capitalista podem se exacerbar ainda mais. Como no caso das ideias sobre o valor da linguagem, a escolaridade e os ditos "erros" de Português. Exemplo maior disso são os "memes" e coisas parecidas que fazem referência ao Português "mal colocado" de determinadas camadas sociais. Imagens com frases do tipo "Por trás de cada 'menas' existe um ensino fundamental incompleto", além da ironia e preconceito inclusos na frase, uma total falta de conhecimento sobre os fatores que levam a isso passa pelos que publicam coisas semelhantes, inclusive pessoas ditas de esquerda.

Findo meu primeiro parágrafo citando os de esquerda para lembrar que a linguagem, embora não tenha sido objeto de estudo prioritário para os marxistas, sempre compôs o corpo do que compõe um todo complexo filosófico, político e ideológico sobre o qual poderíamos nos debruçar. Marx e Engels, em A Ideologia Alemã já nos diziam que "(...) O 'espírito' tem consigo de antemão a maldição de estar 'preso' à matéria, a qual nos surge aqui na forma de camadas de ar em movimento, de sons, numa palavra, da linguagem. A linguagem é tão velha como a consciência - a linguagem é a consciência real prática que existe também para outros homens e que, portanto, só assim existe também para mim, e a linguagem só nasce, como a consciência, da necessidade, da carência física do intercâmbio com outros homens".  Essa constatação - a de que a linguagem nasce da necessidade do intercâmbio entre os homens - é ponto de partida para o entendimento e também para a polêmica em torno do debate. Foi na União Soviética que o debate sobre a linguagem teve seu período mais eufórico. Bakhtin, por exemplo, atesta-nos que "A comunicação verbal, inseparável das outras formas de comunicação, implica conflitos, relações de dominação e de resistência, adaptação ou resistência à hierarquia, utilização da língua pela classe dominante para reforçar seu poder etc." O autor, em sua obra "Marxismo e Filosofia da Linguagem", ainda reforça: "É preciso fazer uma análise profunda e aguda da palavra como signo social para compreender seu funcionamento como instrumento da consciência." Foi ainda no seio da Revolução de 17 que surgiu o que seria uma boa polêmica: seria a linguagem uma super-estrutura? Essa polêmica passou a ser exercitada entre o romeno N.J Marr e Stálin; dessa forma, Stálin pareceu ter dado uma boa resposta a essa polêmica, quando diz que a super-estrutura política e ideológica muda de acordo com a mudança da infra-estrutura, embora aquela possa exercer semelhante influência e contribuir para o processo de perpetuação de determinado sistema econômico, o que não seria o caso da linguagem especificamente, já que esta não muda de acordo com a mudança da infra-estrutura e sim da super-estrutura, portanto não seria uma super-estrutura. Mesmo tendo acertado nessa questão, Stálin pareceu não entender o caráter de classe que a linguagem poderia exercer e por isso criticou duramente Marr e seus discípulos. A isso, a resposta de Bakhtin parece apropriada: "Todo signo é ideológico; a ideologia é um reflexo das estruturas sociais; assim, toda modificação da ideologia encadeia uma modificação da língua." Portanto, nem a linguagem, nem a análise que fazemos dela são neutras.

Sendo assim, o juízo que se faz dos chamados "erros" de português cometidos nas redes sociais pode sim ser uma questão de classe. Essa observação parte do pressuposto, principalmente após as teorias sociolinguísticas - cuja contribuição é imensa - de que as línguas mudam com o passar do tempo. O preconceito parte, em grande parte, pelo desconhecimento de que essas mudanças atingem sempre partes da língua e não seu todo. Essas mudanças, com certeza, atingem a fala de maneira mais intensa que a escrita, fator que gera determinadas "distorções" de alguns grupos sociais na escrita, principalmente nas redes sociais, pois a "implementação das inovações é feita principalmente pelas gerações mais jovens e grupos socieconômicos ditos intermediários", segundo Faracco. É dessa forma que a escrita utilizada por determinada camada social no Facebook, por exemplo, causa choque e ironias por parte de uma parcela populacional que teve acesso ao estudo da chamada "norma padrão", pois o que chamamos de certo nada mais é do que a variante linguística hegemonizada politica e culturalmente, num país cujas dimensões continentais abriga diversos "falares" e reproduções na escrita. Obviamente, a não aceitação dessas variantes menos prestigiadas socialmente parte do fato de que a escrita está ligada a contextos sociais de formalidade e que a escrita é mais conservadora que a fala. Ninguém escreve como fala. Mas num baixo nível educacional, é mais frágil a relação que se faz entre fala e escrita. A reprodução do que se fala para a escrita é feita de maneira menos "criteriosa". Por isso, os grupos implementadores de mudanças têm geralmente baixo prestígio social - e sua fala/escrita é marcada negativamente.

Falo tudo isso para apresentar dois fatores que, para mim, são essenciais: 1) Assim, como tudo na vida, a língua vive em eterno movimento e que, como o método materialista dialético nos ensina, a transição é feita de maneira não-linear, portanto, também na língua, existe um conflito entre o novo que surge e o velho que pretende se perpetuar. É, então, salutar que mantenha-se uma postura minimamente respeitosa no que tange essas mudanças. 2) Não podemos fazer comentários sobre a linguagem de qualquer um que seja sem se correlacionar com a questão social. Num país como o Brasil, cujos tamanho, desigualdade social e diversidade cultural costumam marcar nossa identidade, é inaceitável que mantenhamos preconceitos com os falares dos mais pobres, dos que não tiveram acesso a educação de qualidade e, obviamente, esse preconceito passa à escrita. Dessa forma, encerro meu texto dizendo que, sim, por trás de cada "menas" publicado no Facebook existe um ensino fundamental incompleto, assim como a falta de oportunidades, de saúde e de educação de qualidade. Não é o "menas" de tantos que está errado, é o "mais" de poucos que perpetuam seu poder político, econômico e ideológico, inclusive entre nós. Mudemos, então!

domingo, 11 de agosto de 2013

Guerra Fria

No começo era tudo explosão, era Hiroshima e Nagasaki, radioatividade de corpos, cheiros e paladar que causam efeitos de décadas. Mas também era doce, era do céu e era do inferno. Esse ataque produziu efeitos geopolíticos graves, mudanças de relações diplomáticas, abalo nas transações comerciais. E enfim, teu país se fechou ao meu exército.

Meu exército, frágil qual minha fronteira; tua fronteira, frágil qual teu comando. Meu exército, sempre voltado para teu território, de armas na mão e tentando se proteger do inesperado. Tua fronteira, fechada, artificialmente protegida, com palavras secas e olhares distantes, mas com uma brecha de esperança por paz mundial. E assim, seguia-se a diplomacia. Um frágil muro de Berlim, que sempre poderia ser violado e a eterna tensão das Coreias.

Meus mísseis sempre voltados ao coração do teu país, buscando atingir em cheio o que o faz funcionar, mas teus bombardeios produzindo chamas incontroláveis. Chefes de Estado que se cumprimentam, num frio apertar de mãos. Eterna Guerra Fria.

Nessa Guerra Fria, todas as armas guardadas e todas as armas empunhadas, bombas de efeito imoral, baixa de proteção. Nessa Guerra Fria, sopros gelados no ouvido, soldados que sussurram pedindo morfina, pedindo, mais uma vez, a sensação de prazer por andar no breu, de sentir o gosto de mel e canela. Nessa guerra fria, só há o gosto amargo da negação, de países que nunca encontrarão a paz. Ataque e defesa eternamente postas, eternamente em alerta. Nessa Guerra Fria, vencedores não há; apenas a sensação de ludibriar a defesa alheia, de roubar o petróleo de sua terra, de usurpar seu poder.

Poder. Na disputa eterna por ele, nenhum território pode exercer sua soberania nacional, o seu bem-querer, a sua eterna liberdade. Nessa disputa de poder, colônia vira metrópole, metrópole vira colônia - querem dominar e serem dominados, buscar e serem buscados. Nessa Guerra Fria, meu país e suas armas estão a postos, apenas esperando o gatilho ativar, por um momento de paz, nem que seja fictícia, qual os filmes de guerra, em que um herói salva o mundo e este descansa em paz. 

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Quero cantar o que é belo

Quero cantar o que é belo, embalar-me nessa melodia
Soletrar cada gota de chuva que lentamente beija o chão

Abaixo o salário na poesia!
Abaixo a prosa de rebeldia!

Quero gritar que a luz me despertou pra vida
Quero lembrar do assobio a minha porta, ou do sorriso que invade calmamente a janela de minh'alma...

Abaixo o azedume poético!
Abaixo a crítica literária!

Quero bailar minhas palavras, rotas e imprudentes
mas ávidas de sentidos para o belo ouvir.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Rua Frei Manoel Calado

Casa da minha vó... Ainda sinto o cheiro do guizado aquecendo na cozinha. Pirão forte, comida que "dava na fraqueza".

Lembro das mangas que lambuzavam meus dedos; pés eram vários: manga espada, manguito, manga rosa... com gosto de infância descalça, que construía palcos de tijolo para mostrar o talento na roda das tias.

Rua Frei Manoel Calado, até hoje não sei quem te batiza, mas sei da esquizofrenia que te benze e, hoje, estás tao mudada. 

Eram grandes casas... Entrávamos em quase todas. Copo d'água ou bola de gude; servia até a cabra cega entre os motivos para frequentá-las.

Nas vendinhas da rua, éramos os mais felizes: paçoca com gosto de conquista por ter lavado o carro da tia. Comer devagar pra não acabar...

Mas acabou. Diferente da paçoca que era apreciada lentamente, a infância passou dizendo adeus, junto com os pés de manga que minha vó derrubou para abrigar os seus. Nas ruas da minha infância, estão escondidas as febres pelas saudades, o medo do carnaval e a vontade de andar descalço novamente. Agora, a vida é asfalto: duro e quente, sem a maciez da terra, que mesmo quente e cheia de pedras no caminho, nos proporcionava a beleza de desenhar um sol num dia de chuva, até mesmo de derreter-se com a chuva que caía e oferecer-nos seu cheiro de satisfação.

Hoje, esperamos da vida um cafuné, qual aquele que só nossa vó sabia. E mesmo no asfalto, sinuosamente retorno, de olhos fechados e coração aberto ao lugar que guardo em mim, na rua que me fez quem sou.