quinta-feira, 23 de abril de 2015

Carlos Eduardo Siqueira: Quem matou Getúlio Vargas?



Todas as vezes que o debate sobre a Era Vargas vem à tona, eu me pergunto: quem matou Getúlio Vargas? Sobre o seu suicídio, em carta ele abre dizendo “Mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim.”, demonstrando o ambiente político da época, passando por alguns setores durante a ditadura militar (as principais figuras foram soldados de 30) até o discurso no Senado antes de assumir a presidência, de modo similar ao que dirá FHC, décadas mais tarde: “Resta, contudo, um pedaço do nosso passado político que ainda atravanca o presente e retarda o avanço da sociedade. Refiro-me ao legado da Era Vargas — ao seu modelo de desenvolvimento autárquico e ao seu Estado intervencionista.”  

Estas forças representadas na fala de FHC, que, compromissadas com o interesse das elites internacionais, é de fato quem matou o presidente Vargas e que reiteradamente continuando a matar o seu legado, forças que, comprometidas com o capital e suas operadoras em solo pátrio, buscam desequilibrar o interesse da nação em detrimento das condições trabalhistas e de produção nacional para beneficio de um “clube” que só espolia e destrói nossos desenvolvimento e força produtiva nacional.

Ao relembrar este ínterim do tempo, quero resgatar a luta trabalhista durante a década de 30, e denunciar os assassinos do legado de Vargas, que, mesmo após seu suicídio, tentam enterrar com ele o legado de conquistas trabalhistas, composição da indústria nacional e o papel do estado brasileiro na vida de uma nação pujante, economicamente forte.

As contradições vindas da questão do trabalho no Brasil datam do fim da escravidão, e a chegada dos imigrantes de outras nacionalidades, principalmente os Italianos, marca a introdução do trabalho assalariado no país. As forças de trabalho crescem e, com suas grandes promessas, trazem consigo o anarquismo e o sindicalismo já presentes no continente europeu e que aqui vão se transformar no anarcosindicalismo em lutas que marcaram o fim da República Velha e a nova fase da República Nova, e que em 1930 ganham força com a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio – primeiro ato no processo da revolução de 1930. Com a introdução do processo da recente e precária industrialização do Brasil, uma nova classe toma a cena nacional: são os Trabalhadores com suas pautas e lutas por melhores condições de vida e de trabalho.

É neste contexto que a histórica luta do trabalhismo e da classe trabalhadora vão se forjar, formando diversos grupos e organizações que, durante toda a década de 1930 e 1940, vão conquistar direitos para sua causa; a principal delas acontece em primeiro de maio de 1943, com a promulgação da Consolidação das Leis Trabalhistas – a famosa CLT.

Ao tratarmos do tema anterior, é preciso relativizar alguns pontos; porém, é inegável, para os avanços do país, os feitos trabalhistas implementados pela revolução e por Getúlio Vargas, colocando as contradições de lado. É neste período que as conquistas sociais para o conjunto da classe trabalhadora se firmam até os dias atuais.

Como podemos ver, a tentativas de ludibriar e enganar a classe trabalhadora no Brasil não são novas e sempre contam com apoio de parte da burguesia nacional ligada aos interesses do capital estrangeiro. O que chama atenção é a resistência a estas tentativas: a união de setores progressistas, patrióticos e nacionais junto aos trabalhadores é o que tem garantido essa manutenção dos direitos trabalhistas, apesar das inúmeras tentativas de destruí-las.

Por isso não deve nos espantar o projeto de lei 4330, que, na prática, tenta nos últimos 10 anos destruir as relações de trabalho e produção do Brasil. Com o avanço da crise econômica do capitalismo e decadência dos países capitalistas centrais, os setores do empresariado buscam com esse projeto se antecipar aos prejuízos e jogar para os trabalhadores o pagamento desses mesmos prejuízos que podem ser adquiridos pela crise que chega ao Brasil.

A terceirização das relações trabalhistas é uma velha medida que os governos neoliberais tentaram colocar em prática na década de 1990, e que, sem sucesso naquele momento, parte para nova tentativa, fruto da eleição do Congresso mais conservador desde 1964. As velhas raposas capitalistas tentam mais uma vez colocar na lona todo o legado das conquistas trabalhistas.

Mas o que seria este processo de terceirização?

O projeto tenta flexibilização de todas as profissões-fins, hoje só permitida para prestação de serviços-meios, ou seja, com a aprovação da lei, professores, enfermeiros, médicos, entre outras profissões, estariam em risco e autorizadas a serem operadas por empresas com essa finalidade.

Para termos uma ideia destas tentativas, nos anos de 1995 a 2002 a taxa de terceirização em SP saltou de 8,9% para 97,6% no saldo líquido de empregados. Com a eleição de Lula em 2002, essa taxa decresceu para 13,6% no mesmo Estado até 2010.

Demonstrando a tentativa de precarização do trabalho, as medidas que visam terceirizar o trabalho no Brasil têm ligação direta com a redução de custos para determinados setores da produção nacional, livrando assim os grandes setores da produção nacional de encargos e obrigações trabalhistas no atual modelo que temos regido pela CLT.

A 4330 visa, na verdade, regular as relações dos lucros e prejuízos dos patrões, e não a relação dos trabalhadores nesta modalidade de trabalho, pois pesquisas apontam que rotatividade é de 3 anos a menos que nos empregos de outra modalidade; a jornada de trabalho é 3 horas a mais, ganham 25% a menos, estão mais vulneráveis a acidentes e 8 em cada 10 mortos estão nos terceirizados; o mais grave é que 90% dos trabalhadores resgatados em condições análogas ao trabalho escravo são terceirizados, segundo informações do DIEESE.

Essa seria a verdadeira intenção da PL.4330: ao invés de ajudar, como diz os que defendem o projeto, entre eles Paulinho da Força, sindical que está apoiando a iniciativa dos patrões, na verdade regulamentaria condições precárias e desequilibraria a produção nacional, criando empresas sem trabalhadores. Na atual política tributária sobre pequenas e médias empresas, comprometeria a arrecadação tributária no Brasil, já que estas empresas não se enquadram na modalidade atual daquelas que contratam profissionais de modalidade-fim. Como disse o presidente do TST, essa ação criaria grave problema fiscal levando a prestação de serviços como saúde e educação a uma drástica diminuição de verbas, assim precarizando ainda mais esses serviços que, na prática, atendem aos trabalhadores em sua grande maioria.

Neste sentido, a visão geral é que em grande parte a medida precariza os serviços, a produção e coloca na rota de precarização a contratação destes novos postos terceirizados de trabalho: o da juventude. Se quisermos ver como seria esta prática, é só olharmos para os centros de callcenter que praticam hoje relações que precarizam e exploram os trabalhadores, tendo os jovens como presas fáceis dessas novas práticas (já que seriam a nova mão-de-obra recém saída das universidades para contratação das profissões-fins) e que, sem perspectivas de trabalho, seriam obrigados a abraçar empregos com valores baixos.

Por fim, as tentativas destes setores têm com objetivo a precarização do trabalho e a valorização do lucro. Frente ao acumulado da crise que agora chega ao Brasil com força, esses elementos querem garantir que seus interesses estejam resguardados por leis, e que no fim os trabalhadores paguem a conta. Portanto, é preciso que nos mantenhamos mobilizados por todo o país contra a PL 4330, construindo movimentos capazes de explicar e combater essa medida, denunciando parlamentares que votaram a favor e fazer uma grande campanha, pois esta pauta tem adesão em todas as camadas sociais e conta com amplo apoio daqueles que desejam ver o Brasil forte e soberano. Lembremos que, onde a medida foi aplicada, não sobraram direitos trabalhistas para contar a história, de modo que agora está em nossas mãos a manutenção do legado de Vargas. A CLT é a testemunha ocular da história, e, caso seja aprovada a PL 4330, saberemos quem são os verdadeiros assassinos de Getúlio Vargas.


*Professor Carlos Eduardo Siqueira Pinheiro é Diretor Nacional de Jovens Trabalhadores da UJS|Brasil,  estudante de História e professor na rede estadual de SP.

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