quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Wallace Melo e Nilson Vellazquez: JUVENTUDE E TRABALHO: AS CONTRADIÇÕES DO PRIMEIRO EMPREGO E A EXPLORAÇÃO NO SETOR DE TELEMARKETING

“ O processo de produção capitalista, considerado em sua continuidade ou como processo de reprodução não produz, portanto, somente mercadorias ou a mais-valia; produz e reproduz a própria relação capitalista: de um lado o capitalista, de outro, o assalariado.”
Marx - O Capital

A construção das relações e dos direitos trabalhistas no país se efetivou mediante contextos sociais pautados pelos antagonismos e pelas disputas de interesses entre os representantes direto do capital e os trabalhadores. Nesse sentido, as políticas e os métodos de recrutamento de mão-de-obra que historicamente foram instituídos ao longo do tempo também derivaram dessas contradições, e assim, sua análise nos permite um entendimento mais aprofundado sobre os valores e contrastes presentes no mundo capitalista.

Sem prejuízo ao que será tratado adiante, torna-se até oportuno ressaltar que dentro da lógica hegemônica do mundo laboral, o trabalhador se vincula diretamente à produção, tornando-se “servo” de uma relação no qual, quanto “mais valores cria, mas sem valor e indigno ele se torna”. (MARX, 1844). A exploração dita o cotidiano do trabalho. O direito por sua vez, enquanto produto de reflexões e das doutrinas filosóficas, jurídicas e sociais, também se orienta pela pragmática. Diante disso, a realidade que se apresenta à classe trabalhadora – mesmo sendo essa, construída a partir de uma mediação entre os diferentes interesses econômicos e atores envolvidos - ainda é a concretização da hegemonia dos valores oriundos do mundo burguês.

Os paradigmas que regem o mundo do trabalho relega aos menos favorecidos todas as mazelas sociais. Em nome da sobrevivência, milhares de trabalhadores se obrigam a conviver e a naturalizarem em suas vidas as regras do sistema capitalista, restando apenas – enquanto defesa de sua integridade, dignidade e interesse enquanto classe social - a sua capacidade de organização sindical e o apelo ao cumprimento da legislação trabalhista. Mas ainda há um grande abismo que separa entre o dito e o feito, o real e o ideal.

Contextualizando o que foi dito, podemos avaliar o caso da fiscalização feita pelos auditores do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) no prédio da Contax, localizada no bairro de Santo Amaro, Recife/PE como om exímio exemplo de exploração, terceirização e desrespeito às leis e aos direitos humanos. A instituição citada é conhecida em todo o país, notável é a sua importância econômica para o setor de telemarketing, o departamento de recursos humanos da empresa é responsável pela constante contratação de grande quantidade de trabalhadores para atuarem nas suas diversas filiais. O público selecionado é em sua maioria jovem e que normalmente são recrutados  prestar serviços aos bancos e empresas de telefonia, destacando-se as seguintes instituições: Oi, Vivo, Santander, Itaú, NET, Citibank e Bradesco.

E diante desse contexto, a organização do trabalho encontrada dentro do setor de telemarketig é orientada  na maioria das vezes pela parte mais nociva da terceirização. Muitas cobranças, metas faraônicas e amplo grau de desrespeito à integridade física e moral dos funcionários. Os baixos salários são antagônicos aos contratos milionários que as empresas que atuam no setor fazem com seus clientes maiores. E dentro desses postos de trabalhos encontramos um verdadeiro mundo de ilusões. O convite ao emprego e a ascensão profissional obriga a uma sujeição de regras e metas assustadoras, institucionalizando assim um ambiente de exploração, semiescravidão, agressão aos direitos humanos, assédio moral e doenças laborais (depressão, síndrome do pânico etc).


As normas impostas pelo setor chegam a contradizer a própria legislação trabalhista e a todos os princípios que norteiam uma concepção de trabalho decente. No caso da Contax, foram notados pelos auditores do Ministério do Trabalho e Emprego casos de proibições restritas a idas ao banheiros, imposições severas às trabalhadoras gestantes e lactantes, metas humanamente impossíveis de serem alcançadas, não emissão de contracheque, dívidas de FGTS, débitos salariais etc.

Nesse sentido, tanto para os recém ingressos no mundo do trabalho, quanto para os que acompanham e mobilizam pelas causas da juventude, nunca foi segredo para ninguém as condições degradantes a que são submetidos os funcionários do telemarketing, em especial os da Contax. Por trás de toda a exigência de tratar bem o cliente, há, naquele ambiente, desrespeitos a direitos trabalhistas e exacerbação da carga de trabalho proposta.

Por isso, nós dos movimentos sociais, repudiamos veementemente o descumprimento das leis trabalhistas pela empresa Contax, bem como toda exploração e precarização do trabalho, principalmente da juventude. Cientes de que a maior parte do público trabalhador dessa empresa faz parte dessa fase etária, fazemos refletir sobre o grau de comprometimento do empresariado nacional para com o desenvolvimento que leve em conta os aspectos humanos e não apenas os números e metas.

Sabemos, também, como afirmamos acima, que esse episódio é apenas mais um sintoma de um mal maior que é a terceirização do trabalho. As empresas mencionadas acima, entre elas grandes bancos, passam impunes, pois os vínculos empregatícios são completamente precários, elevando à máxima potência o grau de exploração a que esses setores submetem a classe trabalhadora. Portanto, fazer desse episódio mola propulsora para combater a exploração sem limites do trabalhador e combater a terceirização fazem parte de nossa agenda como formas de garantir um desenvolvimento em que a classe trabalhadora e a juventude estejam inseridas nesse processo, contra todos aqueles que desrespeitem o trabalhador e a juventude: não passarão!

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Educação brasileira: os próximos passos

A chegada de Lula ao poder em 2003, mesmo guardando a devida prioridade ao fim da miséria, através, sobretudo, de programas de transferência de renda, não poderia deixar a segundo plano aspectos fundamentais para a constituição de uma nação soberana; dentre esses aspectos, a sociedade brasileira clamava por uma mudança profunda na educação. Hoje, a educação não sai das bocas e dos discursos de candidatos, sociedade e movimentos sociais. As mudanças aconteceram, mas por que tanta gente ainda clama por mudanças na educação?

Se pudermos olhar um pouco mais para trás, reconheceremos as inúmeras medidas para as conquistas recentes: a ampliação do número de escolas técnicas federais - com a criação dos IF's -; aumento do número de vagas nas universidades federais, com criação de mais universidades e sua interiorização; criação do PROUNI, cotas e REUNI.

Podemos, dessa forma, afirmar sem nenhum medo, que a pauta do acesso, embora hoje ainda seja de 16% a taxa de jovens nas universidades, foi de certa forma superada, mas seus resultados passarão a ser sentidos mais a médio ou longo prazo. Essas conquistas foram efetivadas graças à imensa mobilização dos movimentos sociais, sobretudo da UNE e UBES, que imediatamente depois à conquista de elegermos um operário presidente tinha uma pauta de reivindicações a ser entregue e seus resultados vemos hoje.

A constatação de que muito foi conquistado ao proporcionarmos o acesso não nos imobiliza; muito menos a de que muito há pra fazer nos desespera. É preciso, agora, discutirmos que educação queremos.

O desafio atual, a médio prazo, é discutir o modelo educacional brasileiro, levando em conta, principalmente, a elevação da condição social de mais de 30 milhões de brasileiros. Esses brasileiros, são, em sua grande maioria, jovens que, além de beneficiários dos programas de transferência de renda, beneficiaram-se com programas educacionais como PRONATEC, cotas e PROUNI. Como para cada passo dado uma nova necessidade é criada, é preciso refletir sobre que formação essa "nova classe média" está recebendo. Exemplo maior dessa reflexão é saber que mais de 1 milhão de jovens ingressaram nas universidades através do PROUNI que, junto ao FIES e outras bolsas, contribuem para que a maioria dos estudantes universitários do país estejam em instituições de ensino particulares, cuja lei do mercado regula o tipo de educação dada; muitas vezes - na grande maioria - de baixa qualidade e formadora de cidadãos cujas principais referências são o senso comum: ódio à política; pouca formação crítica e baixíssimo conhecimento de mundo; interessando-se pura e exclusivamente pelas suas áreas de conhecimento e tendo como fontes de informação - quando tem - Veja e Jornal Nacional, ajudando a explicar o fenômeno conservador das eleições recentes

Cabe ao movimento educacional, portanto, incluir na sua agenda o tema da Reforma Universitária com mais afinco, pois, conquistados os recursos, é preciso definir o seu uso: professores valorizados, discussão dos currículos no ensino fundamental, médio e superior, infraestrutura de qualidade. A disputa por um modelo de universidade democrático e de qualidade para o próximo período não se resume à vida universitária, mas influencia no modelo de sociedade e de desenvolvimento que queremos, inclusive na educação básica.

A reforma educacional que queremos deve perseguir a formação de cidadãos críticos, interessados na soberania nacional e em desenvolver o país. Para isso, garantir a permanência dos estudantes nas universidades, instituir os ciclos básicos e acabar com os departamentos são pautas que crescem em importância para os debates vindouros. Transformar a educação brasileira é condição basilar para um novo projeto nacional de desenvolvimento. Suas mudanças são lentas, graduais, mas duradouras, permanentes e sólidas. Bases essenciais de uma nação forte e soberana.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

O Brasil de hoje: necessidades e mudança


O Brasil tem vivido nos últimos três anos, sem sombra de dúvidas, momentos dos mais importantes da sua história. Os episódios vivenciados recentemente possibilitam que os livros de história de anos subsequentes lembrem desses dias dando-lhes o devido destaque. Afirmo isso três meses após àquela que pode ser chamada de a mais disputada das eleições presidenciais "dos últimos tempos" e na expectativa de quatro anos de um governo novo, preparado para reafirmar posturas que possam beneficiar o povo brasileiro.

Nunca é demais, portanto, relembrarmos por que afirmo serem os últimos três anos e não mais, incluindo aí os 8 anos de governo Lula. Afinal de contas, é óbvio e até repetitivo afirmar o sentido histórico da eleição e governo do Lula para o Brasil, tendo inclusive, a partir de seu governo os desdobramentos dos episódios que mencionarei.

A eleição do primeiro presidente operário, além de ter representado uma grande vitória das forças progressistas, democráticas e nacionais, teve como sentido maior a união de brasileiros em torno de finalizar um processo histórico de ausência do estado no suprimento de necessidades básicas do povo, tendo como elemento central o direito à alimentação. Para isso, programas como o Fome Zero e, posteriormente, o Bolsa Família foram fundo naquilo que mais abismava brasileiros e não-brasileiros acerca da nossa realidade: como um país dessa dimensão, como tamanha riqueza, entre as maiores economias do mundo, líder de produção em diversos setores agrícolas produz tanta miséria? Como um país como esse tem 40 milhões de miseráveis?

O Governo Lula, dessa forma, perseguiu de maneira exemplar o fim dessa trágica situação nacional e, sobre esse objetivo, obteve sucesso. Para isso, precisou levar a cabo um programa de governo que conciliava os mais variados setores de nossa sociedade: trabalhadores, banqueiros, burguesia produtiva nacional, sub-proletariado etc.. Um governo com essa variedade, obviamente, tem limites. Porém, nenhum limite sobrepõe-se à mudança na qualidade de vida do brasileiro, que passou a fazer três refeições por dia, ter seu emprego, estudar e consumir; de modo que, bem resumidamente, podemos afirmar: Lula venceu.

Coube a Dilma, oito anos após essa etapa, proclamar o lema "avançar, avançar e avançar". Dilma Vana Rousseff, primeira mulher presidenta do Brasil, tem histórico na luta armada contra a Ditadura. Guerrilheira, não se absteve de tentar em meio a uma grave crise mundial trazer seu governo mais à esquerda e avançar na qualidade de vida do povo. É a partir disso que começam os três episódios mais marcantes de seu primeiro governo.

Em agosto de 2012, Dilma inicia, com a redução de 0,50% na taxa SELIC, a maior queda da taxa de juros da história do país, chegando a seu menor número até abril de 2013. Em janeiro de 2013, a presidenta anuncia a redução na conta de energia de todo o país, mesmo com os governadores tucanos boicotando sua decisão. E, finalmente, em junho de 2013, enfrenta as maiores manifestações populares do país, desde o impeachment do presidente Collor.

É a partir desse momento que as contradições de um governo de coalizão e de um modelo de desenvolvimento voltado majoritariamente para o consumo passam a ser questionadas, sem, em nenhum momento, pedir que esse ciclo acabasse, e sim, que avançasse. Obviamente, um ano e meio depois das manifestações, sobra-nos um saldo de necessidades novas que foram cobradas a ferro e fogo: serviços públicos de qualidade e mais direitos. Mas não anula a evidência de - sobretudo após os resultados das últimas eleições e ascenso da direita - uma maior articulação e organização de grupos de direita (anarquistas, fascistas) perturbados pela perda de privilégios. A ebulição e a contradição gerada no seio do estado burguês brasileiro são explicadas, em grande parte, pela mudança que a eleição de um operário gerou e à luta incessante do novo com o velho. Como diz Erwin Marquitt, "a própria mudança constitui também, uma unidade de opostos. De modo geral, um sistema que atravessa uma mudança está se tornando algo que ele não era e está deixando de ser o que era." Essas mudanças, não obstante, geram mudanças nas necessidades - categoria dialética sobre a qual afirma Lênin: "se isto é possível ou impossível, depende do conteúdo, isto é da totalidade dos momentos da realidade, que no seu desdobramento se mostra como necessidade". Dessa forma, a realidade atual, de avanços e recuos, de conquistas e de disputas - vide os números apertados da última eleição e o eterno terceiro turno - levam-nos a voltarmos os olhos para novas necessidades, novo governo, novas ideias, pois as necessidades estão em constante evolução.

O significado histórico da presença de 16 anos das forças progressistas renovam as chances e as expectativas de verem essas necessidades serem transformadas em outras necessidades, em outras possibilidades, em novas realidades. Não fosse a presença do PT e seu arco de forças aliadas no poder, entre elas o PCdoB, as necessidades levadas em contas seriam as mesmas de 500 anos atrás: manutenção de privilégios e de um status quo. Realizar as mudanças que queremos exige uma luta ainda mais valente em torno da consecução vitoriosa desse projeto, reconhecendo que a sociedade está mobilizada para os dois lados da balança, num equilíbrio frágil, cujo ator principal pode e deve ser aqueles que atuam com os pés fincados na realidade, em busca de mudanças reais para a vida do brasileiro e da classe trabalhadora, um Brasil de direitos, conquistas, justiça e igualdade. O Brasil que merecemos.