sábado, 19 de julho de 2014

Instante

Fecho os olhos
Respiro o mundo
Estrelas circulam, bem lá no fundo...

na esquina da retina
procuro abrigo
eis o instante
que me encontro comigo

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Sobre o ensino de língua portuguesa




Certa vez, não faz muito tempo, escrevi neste blog sobre o preconceito propagandeado por usuários de redes sociais contra os supostos “erros de português” cometidos nas mesmas. Episódios como esses, além da minha experiência profissional, estimulam-me a continuar raciocinando sobre algo fundamental na constituição de uma nação: o ensino de sua língua materna; em nosso caso, do português.

De fato, o primeiro contato que temos com toda a história de se estudar a língua que falamos é através da escola, e através da maneira pela qual a escola encara como deve passar um conteúdo que é, sobretudo, metalinguístico. Além do bê-a-bá inicial para aprender a ler, segue-se uma série de conceitos por muitos desconhecidos: substantivos, adjetivos, verbos, adjuntos adnominais. Portanto, como lidar com tais conceitos e formar, principalmente, leitores?

Na universidade, os postulantes a professores de língua portuguesa são submetidos ao debate sobre a eficiência ou não do ensino tradicional, baseado na gramática prescritiva, ou  sobre o uso do texto como base de todo ensino de uso da língua. Para adentrar nessa (falsa?) polêmica, é preciso fazer uma regressão e lembrar alguns fenômenos ocorridos no Brasil.

Primeiramente, é preciso lembrar que a Universidade é uma instituição relativamente recente no Brasil. Em comparação a outros países da América Latina, o Brasil partiu bem depois. Para se ter exemplo, praticamente um século antes, países como o Chile já tinham catalogadas e estudadas centenas de línguas de seus povos autóctones, mesmo com a dominação espanhola e, consequentemente, de sua língua ter-se tornado dominante. No Brasil, além de um notório desprezo pelas línguas indígenas, a formação de uma elite “estrangeira” em nosso próprio país contaminou também a maneira pela qual valores como a língua eram passados e estudados; ou seja, voltados à Europa. Para além dessas questões, saltam aos olhos o fato de, mesmo assim, o Brasil – país de extenso território – falar a mesma língua.

Dessa forma, o ensino da língua portuguesa, dentro dessa lógica colonialista sempre teve, no Brasil, ares de doutrina, seguindo-se regras da chamada gramática prescritiva da qual se precisava afirmar o que pode e o que não se pode fazer. Além, é claro, da segmentação estrutural da língua, que até hoje é passada com ares de ciência. Entretanto, o estudo da língua(gem), mundialmente, adquiriu nova importância, sobretudo depois da proposta estruturalista de Ferdinand Saussere, mas também, através de seus desdobramentos  - tanto favoráveis quanto contrários às suas teses.

No Brasil, tenho a ligeira impressão de que a ciência Linguística só veio se tornar “popular” através do boom da Sociolinguística, que passou a considerar elementos sociais para analisar, estudar e ensinar línguas. Para muitos, inclusive, no Brasil, Linguística virou sinônimo de Sociolinguística, pondo em polos opostos e em constante luta intelectual, radicais de dois tipos: primeiro os “filólogos”, gramáticos prescritivistas, amantes da boa regra de uso da língua; do outro lado, os radicais da boa comunicação e do “se comunicou, não tem problema”. Essa polêmica tem – a bem da verdade – gerado até hoje efeitos danosos na prática cotidiana da sala de aula, desequilibrada.

A evidência que encontro, todos os dias, em sala de aula, é que o professor de língua portuguesa ainda vive a eterna dúvida sobre o que ensinar: a regra ou o texto? Como formar bons leitores? Digo isso, porque, se por um lado houve um exagero na exigência da regra, é óbvio que houve, também, um afrouxamento após se propor o ensino unicamente através dos textos. A universidade brasileira, sobretudo nos cursos de licenciatura – especialmente na Pedagogia – não preparou o alicerce fundamental para isso ainda. A gramática – exercício fundamentalmente metalinguístico – através do bom estudo da sintaxe também possibilita o conhecimento da tecitura, dos fios que compõem um bom texto, cada bordado, cada “miúdo”.


Espero, na condição de professor e militante, que os investimentos vindouros em educação possam capacitar melhor nossos profissionais, a começar por quem e como compõem as LDB’s etc. É fundamental criarmos mecanismos que possam elevar o nível de leitura para tornar esse país uma potência econômica e educacional. Por isso, é tão importante que formemos pessoas capacitadas a conhecer, reproduzir e transformar a língua que usa. A língua que constitui a nossa nacionalidade. Acreditar num país mais forte é também ter em mente a possibilidade de oportunizar cada vez mais pessoas de usarem a sua língua em pé de igualdade aos que têm “educação de qualidade”. Começar pelo ensino disso é, ou poderia ser, um excelente começo.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Agora é lei: Dilma sanciona Plano Nacional de Educação

Retirado de www.une.org.br





Depois de quase quatro anos de trâmite, o Brasil agora tem um novo Plano Nacional de Educação. A presidenta da República, Dilma Rousseff, sancionou na quarta-feira (25/06), sem nenhum veto, a lei que institui o PNE para os próximos dez anos. A UNE e entidades do movimento educacional comemoram essa que é sem dúvida a maior vitória para a educação brasileira. Foram anos de lutas, embates, negociações, mais de 60 audiências públicas e muita pressão no Congresso Nacional.
A partir de agora as políticas para educação aprovadas na lei se tornam políticas de Estado, e os planos de governo e ações da União, dos Estados, e dos municípios terão que seguir as determinações no que se refere ao setor.
Entre os destaques do PNE está a garantia de uma pauta histórica do movimento estudantil: o investimento de 10% do PIB em educação – hoje o valor é de 5,1%.
No primeiro PNE elaborado em 1996, para vigorar entre os anos de 2001 a 2010, teve questões importantes vetadas pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, como o investimento de 7% do Produto Interno Bruto (PIB) direcionado para a educação, que ficou em 3%.

Segundo estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, nos últimos anos o Brasil é o país que mais aumentou o investimento em educação. Foi triplicado o orçamento federal do setor, ampliado e financiado o acesso ao ensino superior, com o ProUni, o FIES e as cotas, e assim duplicamos para 7 milhões as matrículas nas universidades. Além disso, foram abertas mais escolas técnicas em 11 anos do que se fez em todo o Século XX. Saímos de 3,5% do PIB, de investimentos em educação, em 2002, para 5,3%.
“Seguimos atentos e pressionando para que a lei se torne uma realidade. O PNE junto com a aprovação dos recursos do petróleo para a educação foram grandes vitórias e uma grande contribuição que a nossa geração dá para o nosso país. O principal agora é seguir vigilante para que nos próximos anos a gente possa de fato ter esse recurso destinado para a educação brasileira” , destacou a presidenta da UNE, Vic Barros.
O texto publicado nesta quinta-feira no Diário Oficial da União estabelece que “a execução do PNE e o cumprimento das suas metas serão objeto de monitoramento contínuo e de avaliações periódicas”.
Em setembro do ano passado, depois de muita luta dos estudantes, foi aprovada a lei que destina 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde. O texto ainda prevê que 50% do Fundo Social do Pré-Sal também devem ir para as áreas da educação e saúde. Esta semana a presidenta Dilma Rousseff destacou que a exploração do pré-sal pode render 630 bilhões de reais para as duas áreas.
Em entrevista coletiva concedida nesta quinta-feira, em Brasília, o ministro da educação Henrique Paim falou que a destinação de parcela dos royalties do petróleo para a educação é “importante para transformar as metas do novo PNE em realidade”.
A UNE acredita que o PNE poderá representar uma transição de superação dos problemas educacionais históricos, criando as bases de um projeto educacional verdadeiramente emancipador e de acesso a todos.
O Plano Nacional de Educação é constituído por 20 metas, 253 estratégias, a serem aplicadas em 10 anos, e ainda prevê mecanismos de controle e fiscalização social.
“O texto institui fóruns de participação da comunidade e a chave para o sucesso do PNE é essa participação e controle social. Para que sejam políticas efetivas com base nas necessidades das escolas, universidades, municípios e estados do nosso país”, destacou a diretora de universidades públicas da UNE, Mirelly Cardoso.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Esquina da cicatriz

É a mesma paisagem por que passo
da curva que outrora fiz
gritos repetem o compasso
na esquina da cicatriz

cheiros se deitam pra nós
sons a nos conduzir
cuidados de forma atroz
se impõem ao nosso luzir

São vozes roucas, por ora loucas
que o tempo mesmo tratou de induzir
Fechado o tédio e dado o remédio
para a sanidade nos seduzir
Não sei se a vida será garantida
pra'queles que o sonho insiste em dormir

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Esse sou eu quando amo

Esse sou eu quando amo
gastas as horas, cuidando
ombro que é travesseiro
noites só te embalando

Do outro jeito é indiferença:
ligações rejeitadas
fim de semana dormindo
com promessas postergadas

Te querer é novidade
daquelas que mudam a vida
transformando essa amizade
em paixão hoje incontida

Fazendo-me respirar ares tão desconhecidos
lembrando-me que amar é estarmos decididos
a querer atravessar o rio do nosso destino
sem ter medo de afirmar 'somos nós em nosso ninho'

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Amor caseiro


“Vende-se amor caseiro”. Foi o que vi naquela placa à frente da casa humilde. Não precisando comprá-lo, fiquei a indagar o que seria esse tal “amor caseiro” com placa de anúncio.

Amor caseiro é alimento: brigadeiro de panela, feito num domingo de chuva e apreciado na mesma colher; amor caseiro é pipoca quentinha, entrelaçando os dedos por dentro da vasilha e os olhares por dentro da alma. É saliva matando a sede, é corpo matando o frio.

Amor caseiro é a roupa dela em cima da minha, confundindo-se os cheiros, misturando a vontade. Amor caseiro é a disputa do controle remoto, democracia da programação, lugar marcado no meu peito...

Amor caseiro é falta, nunca excedente, não se vende, não se compra. É dor de cabeça, abano e massagem. Beijo no olho, café na cama.


Amor caseiro é ela, amor caseiro sou eu.

sábado, 3 de maio de 2014

2014, eleições e a verdade eleitoral.


O Brasil em mudança

O Brasil mudou. Não há cidadão brasileiro, dos mais bem intencionados aos mais pessimistas, que não perceba essa mudança. As mudanças na vida do brasileiro são mais visíveis do que a frieza dos números pode nos trazer. É mudança de brios, de aceitação enquanto brasileiro, de felicidade. Obviamente, ter feito de um operário Presidente da República mexeu com as prioridades do Estado brasileiro, mas, sobretudo com a esperança de trabalhadores de todo o país.

Nos últimos onze anos de governos populares, podemos afirmar com toda a certeza que temos uma economia solidificada. Mesmo em meio a uma crise econômica profunda do sistema capitalista, o Brasil conseguiu, nesses últimos anos, manter o crescimento econômico duradouro: tivemos, desde 2003, taxa média de crescimento a 3,4% do PIB contra 2,3% do período FHC. A inflação, que no período FHC não deixava de rondar a casa dos 9% de acordo com o IPCA, chegando a atingir no seu último ano de governo 12,53%, nos últimos 11 anos sempre esteve sob controle, na casa dos 6%. Crescemos o número de exportações atingindo mais de 200.000,00 de dólares contra os 73 do último ano de FHC

Nos últimos 11 anos, superamos a ausência total do estado em setores estratégicos para o país. Afinal de contas, quem não se lembra do apagão de energia elétrica em 2001?

Para além das mudanças econômico-numéricas, o Brasil passou a respirar mais democracia. Nunca, se não fosse um governo oriundo das forças populares e de esquerda, poderíamos ter visto a criação de secretarias como as de juventude, mulheres e negros; nunca veríamos o combate às diferenças sociais e regionais como política de estado; nunca poderíamos comemorar aumento real do salário mínimo na casa de 70% desde 2003. Na área da educação, nunca seria imaginável política como a de cotas e a certeza de que é preciso investimento robusto em educação.

Entraves ao desenvolvimento

Mas, mesmo com todas essas conquistas, algo que era essencial para podermos aprofundar e acelerar o processo de transição a um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento é a realização de reformas estruturais, reformas que mesmo no marco do capitalismo dão cabo às necessidades mais urgentes da população brasileira. Não obstante, é importante ressaltarmos dois dos – talvez – mais importantes motivos pelos quais não avançamos mais: primeiro, a tão famigerada “correlação de forças”, a composição  que as forças populares foram obrigadas a fazer desde a carta aos brasileiros em 2002 privilegiou uma aliança com as forças – as maiores, diga-se de passagem – de centro e centro-direita do país (PMDB, PR,PRB), em nome da “governabilidade”; portanto, o país, necessitando desses setores, foi aos poucos cedendo às suas pressões e deixando a segundo plano conquistas mais significativas. O segundo motivo, talvez mais polêmico, seja a falta de vontade mesmo da força hegemônica – o PT – em realizar certas reformas. Digo isso porque nem mesmo é claro para setores do PT a opinião sobre questões como a reforma política, pois quando houve a mobilização a favor do Marco Civil da Internet conseguiu-se aprovar.

Por questões como as colocadas acima, no momento eleitoral, pareceria óbvio que, também devido aos avanços da democracia no país, caberia uma alternativa mais à esquerda no processo eleitoral, uma alternativa que validasse e valorizasse as conquistas recentes e aprofundasse as mudanças, avançasse em questões como a reforma política, a democratização dos meios de comunicação e enfrentasse o capital financeiro com medidas menos causticantes à economia brasileira como a política de juros como único meio de combate à inflação, o superávit primário e o câmbio. Primeiro porque tem sido cada vez mais clara a derrota do projeto neoliberal da década de 90, cujos representantes partidários têm acumulado derrotas eleitorais consecutivamente, mas que mantém como única e grande base de sustentação a mídia conservadora; segundo porque as forças progressistas que deram sustentação ao governo Lula e Dilma revelaram grandes quadros e gestões exitosas em vários estados da federação, como é o caso de Eduardo Campos em Pernambuco.

Terceira via?

O governo de Eduardo Campos em Pernambuco, sem meias palavras, deu certo. Obviamente, há vários fatores para chegar a essa conclusão, entre elas, a mais importante de todas: a decisão política do Governo Federal em diminuir as desigualdades regionais, resultando daí vários investimentos que abriram um novo ciclo na economia pernambucana, que passou a contar com um parque industrial  - refinaria Abreu e Lima, fábrica da Fiat, Hemobrás, estaleiro Atlântico Sul, polo gesseiro do Araripe, polo têxtil do Agreste etc.. É óbvio também que todos esses investimentos só foram possíveis devido a uma grande afinidade política entre Governo Federal e Estadual,  em que desenvolvimento e distribuição de renda e oportunidades foram palavras de ordem.

Para além disso, o modelo de gestão aplicado em Pernambuco ganhou ares de prioridade, com metas a serem batidas, desoneração do estado com diminuição do serviço público, contratação de OS’s, construção de hospitais e um forte investimento em segurança pública a fim de diminuir os índices de assassinatos com o “Pacto pela Vida”.

Por essas e outras, a candidatura de Eduardo Campos parecia justíssima: dentro do campo democrático, puxar o Brasil mais à esquerda, essa seria a missão. Porém, vencer é o objetivo e para isso por que não angariar apoio do setor financeiro? Por que não ganhar o apoio da mídia? Por que não atacar o PT? Essas são as perguntas feitas por quem foi pego pelo “canto da sereia” da mídia, da possibilidade de ganhar as eleições e antagonizar com o projeto construído até então, mesmo que para isso precise defender, por exemplo, “os fundamentos macroeconômicos”.

A verdade em ação

Essas eleições, portanto, não mudam de ares, novamente teremos uma polarização, desta vez governo e oposições, assim no plural mesmo, entre aqueles que querem aprofundar as mudanças e aqueles que querem retomar o projeto entreguista e privatista dos anos 90. Por isso, cabe a nós da esquerda aprofundar e qualificar o debate eleitoral. O debate da economia, por exemplo, precisa ser colocado às claras: quais são os problemas reais da economia brasileira? Para nós, é a grande entrega de dinheiro à agiotagem internacional através do pagamento de juros da dívida, para nós é essa moeda artificialmente sobrevalorizada, para nós é a necessidade de se investir mais na indústria, para nós, é o tripé neoliberal que ainda existe. E para eles, quais são os problemas? O bolsa-famíla? O pleno emprego? O crédito para a classe trabalhadora? Quais os problemas?


Somos nós quem precisamos dizer, propor, dar um sentido estratégico à construção da nossa nação, cuja estabilidade inflacionária deixe de ser o nosso grande objetivo e desenvolvimento seja a palavra de ordem. Debater como financiamos esse desenvolvimento, por exemplo, é essencial. Garantir a justa parceria entre o público e o privado para dar vazão a obras de infraestrutura que precisamos para i) garantir a qualidade de vida nas cidades e ii) integrar um país continental, levando desenvolvimento para todo o país. Para começar, comecemos dizendo a verdade. Vamos à luta!