sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Em momentos de crise profunda, unificar a bandeira de luta!


A crise brasileira atinge grau cada vez mais agudo no momento atual. O centro da crise política que atinge o Brasil parte do princípio de que o impeachment não pacificaria o país como haviam prometido os golpistas. Muito pelo contrário, ele conflagraria o país, e cada dia mais isso está sendo comprovado.

A confusão é grande. E agrava-se mais ainda por uma falta de saída estruturada pelas esquerdas, que, como sempre em momentos de dificuldade, batem cabeça e brigam entre si pelo posto de vanguarda, como prova de certificar suas teses e demarcar espaço dentro do mesmo campo, deixando de falar para os milhões de brasileiros alheios aos detalhes da luta política institucional, mas preocupados com seus empregos e com o futuro do país no sentido mais geral.

A literatura marxista aponta que a luta pelo socialismo é fruto das contradições intrínsecas do capitalismo (trabalho X capital; produção social X apropriação privada; organização do trabalho X anarquia da produção; proletariado X burguesia; imperialismo X povos explorados). Se por um lado, há o consenso de que, no plano econômico é a contradição organização do trabalho X anarquia da produção o maior fator gerador de crises - as chamadas crises cíclicas do capitalismo; por outro, é necessário que tomemos conhecimento de que a cada realidade dada, de cada país e cada momento, a contradição principal de altera.

No Brasil, não em raros momentos, a contradição que mais importância exerceu na luta política nacional esteve ligada à contradição entre imperialismo e povos explorados. Foi essa contradição, entre nacionalistas e entreguistas que moveu as principais lutas políticas do país, com grande destaque para as lutas do período republicano, que culminou com o suicídio de um presidente, a deposição de outro pelos militares - desaguando em 21 anos de ditadura militar - e o impeachment (golpe) da primeira presidenta mulher da história do país.

É, pois, novamente essa contradição que se acentua cada vez mais no Brasil. Todo o golpe, incluindo-se aí todos os aspectos dela - desde a Lava-Jato, passando pela postura de Aécio Neves pós-eleição e as posturas conspiratórias de Eduardo Cunha e Michel Temer  - são obras do exercício cotidiano que o império pratica em nosso país através de seus agentes, de olho em nossas riquezas e nos destinos da 7ª maior economia do mundo.

Perceber isso, parece, portanto, de extrema necessidade para escolher em quais trincheiras atuar nesse momento confuso da luta política no Brasil, pois os golpistas pretendem fazer uma certa varredura da política nacional, quase um "começar do zero" e fazer o país aprender a não votar mais na esquerda, como afirma Boaventura de Souza Santos, utilizando-se dos mais variados agentes - principalmente os do judiciário - e desprezando (ou utilizando quando necessário) outros, como Cunha e Temer.

Os episódios mais recentes revelam as contradições das forças dirigentes do golpe e de quem, de fato, o executa. Quisera as forças obscuras financeiras que o golpe fosse praticado por gente de mais confiança sua - como Serra, Alckmin e FHC, por exemplo - mas o golpe caiu nas mãos de gente como Cunha e Michel Temer, típicos batedores de carteira da política, sem nenhuma confiança das suas forças dirigentes.

É, então, no seio dessas contradições, que as forças progressistas devem buscar atuação, buscando acentuar ainda mais essas contradições, dividindo sempre que possível o lado de lá e buscando, cada vez mais, amplos setores com o mínimo de afinidades com os temas democracia e soberania nacional, eis a chave.

Diante da cada vez mais nítida do judiciário intervir na política - vide Sérgio Moro enviando notinha pela imprensa para confundir o povo brasileiro acerca da famigerada "anistia" ao caixa 2, que, na prática, não existe- e os casos de corrupção, tráfico de influência e crimes lesa-pátria cometidos pelos golpistas, chegou a hora de, mais uma vez levantarmos a bandeira que possa unificar amplos setores da sociedade, em torno da democracia e de um novo pacto nacional, que resgate os direitos sociais garantidos em 88 e dê uma pausa no retrocesso a galope que os golpistas praticam, é chegada a hora das Diretas Já, novamente; um grande movimento cívico de homens e mulheres que lutam pelo Estado Democrático de Direito e pelo Brasil. Chegou a hora! Diretas Já!

sábado, 19 de novembro de 2016

A política é necessária!


Quando eu era adolescente tinha uma banda. Achava que toda a minha rebeldia poderia ser canalizada nas atitudes rock'n'roll e nas letras revoltadas que por ora compunha. Naquele momento, Lula já era o presidente do Brasil, mas lembro-me bem que o conjunto de minhas músicas dedicava-se a criticar o sistema de uma maneira ampla e difusa. Foi, no entanto, alguns anos depois, através do movimento estudantil e, posteriormente, através da vida partidária, que pude canalizar a minha insatisfação e encontrar uma forma de luta organizada. Nesse sentido, lamento profundamente que mais jovens como eu não tenham encontrado ainda essa importante trincheira de luta social.

No movimento estudantil e partidário é que pude identificar o valor da ação política, ou simplesmente da tão alvejada e criticada "política". Foi a partir daí que pude perceber o quanto ela influencia a vida de todos nós: o preço do pão; do gás; da passagem; da gasolina; a novela que passa na TV; o filme que cotidianamente importamos do cinema americano; a roupa que vestimos e as nossas crenças. Quase uma epifania às avessas da célebre frase de Platão: "não há nada de errado com os que não gostam de política, simplesmente serão governados por aqueles que gostam". De lá pra cá, nos meus convívios sociais, sempre escuto ser a pessoa que gosta de política, como se esse ato dependesse da minha vontade, e não fosse uma condição inerente àqueles que verdadeiramente querem justiça social.

No período atual, uma crise se abate no mundo. Não são simples suas causas, muito menos seus efeitos. Essa crise econômica do capitalismo, assim como tantas outras crises cíclicas do sistema capitalista, destrói economias nacionais de Estados que, de alguma forma, em algum dia, conduziram o desenvolvimento de sua nação; desemprega milhões e milhões de trabalhadores pelo mundo todo; provoca guerras e mortes e acaba com as soluções políticas que existem desde a antiguidade clássica. Por ironia do destino, quis a banca internacional, em países como a Grécia e a Itália, por exemplo, colocarem representantes diretos seus para gerir os problemas da crise que eles mesmos geraram.

O Brasil, também vítima dessa crise, sofreu as consequências mais profundas que uma crise econômica pode gerar e, diante disso, sofremos um golpe parlamentar e, mais do que isso, nos encaminhamos para um período ainda mais difícil de nossa recente história - com perdas de direitos sociais e trabalhistas; desemprego; congelamento de investimentos e o mais grave: seguimos o caminho do abismo da negação da política, da execração pública do ato que, querendo ou não, alguém irá fazer.

Se por um lado, no Brasil, faltou uma educação das massas, que pudesse identificar, na política e não necessariamente e unicamente no seu esforço próprio as causas da melhoria de vida recente por que passaram; é verdade também que há uma verdadeira ofensiva reacionária e conservadora das forças materialmente dominantes, que impunham um pensamento único como solução para a vida de trabalhadores que, sim, estão em dificuldades reais. 

As eleições municipais de 2016 no Brasil foram um grande exemplo dessa ofensiva reacionária. Não foram poucos os momentos em que me peguei sendo totalmente desprezado por jovens "descolados" na rua que se negavam a pegar um panfleto com propostas que influenciam diretamente na sua vida; da possibilidade de eleger um vereador cujo poder econômico não seja o decisivo para sua eleição. Foi assustador o crescimento de candidatos ultra-reacionários, com forte adesão popular. Mas o mais decepcionante; a negação, pelos próprios políticos, da política; e isso, tanto os candidatos de direita quanto os de esquerda. Se por um lado tínhamos um João Dória em São Paulo dizendo que não era político, mas gestor; por outro, tínhamos um Marcelo Freixo, do alto de sua arrogância e prepotência, afirmando que era diferente de todos os que conhecemos.

Esta semana, mais um triste episódio aconteceu. Dois ex-governadores do Rio de Janeiro, que, longe de mim tentar inocentá-los, foram presos de maneira desumana e completamente e desacordo com os direitos humanos e com o que conhecemos por Estado Democrático de Direito. Mas o mais triste não é a prisão em si, já que como muitos afirmam vários inocentes pobres são presos todos os dias injustamente, e sim a comemoração que as pessoas fizeram diante do fato - inclusive as ditas de esquerda -, legitimando o estado policialesco que se instaurou no Brasil e a perseguição à atividade política que se implementa atualmente no país. Isso, claro, passando ao longe para as pessoas comuns - e também as de esquerda - que os verdadeiros agentes corruptores do sistema capitalista, que é corrupto por natureza, já que se baseia na acumulação privada de riqueza e usa o estado para tal, estão confortavelmente recebendo seus lucros e dividendos dos juros que, no Brasil, são abusivos; isso sem investir um centavo na produção e na geração de empregos.

Obviamente o povo não é culpado. É a maior vítima de um sistema que, mais do que sequestrar sua força de trabalho, sequestra sua ideologia e, sobretudo, suas emoções. Como afirmou Domenico Losurdo em sua recente obra A Esquerda Ausente, citando Gustave Le Bon, do final do século XIX: "para influenciá-las (as massas) ou controlá-las devia-se apelar para os seus 'sentimentos', para aquilo que 'persuade', e assim provocar entusiasmo por 'ações heroicas evidentemente um pouco inconscientes' ou para 'quimeras, filhas do inconsciente'. Não por acaso, nosso povo tem nutrido o medo à 'quimera' da política e o entusiasmo por heróis togados cujos objetivos escusos de acabar com a nossa economia estão longe de seu conhecimento.

É por isso que não podemos nos afastar do exercício da política - em casa ou no trabalho, no bar ou no estudo - : para que não deixemos que nossas emoções sejam sequestradas pelas classes dominantes, façamos da vida pública - nos movimentos sociais ou institucionais - uma trincheira real pela verdadeira justiça social, para a qual, sem sombra de dúvidas, a política é e sempre será necessária.

sábado, 5 de novembro de 2016

Alianças sem ilusões

Se é verdade que é preciso ter, principalmente no momento atual, muita flexibilidade tática para poder desembaraçar-se da situação difícil que as forças progressistas e democráticas no Brasil vivem, é verdade, também, que, para fazer essas alianças, é preciso identificar de maneira realista quem é quem no cenário político atual brasileiro.

Essa distinção nos é útil, sobretudo para que não se criem ilusões sobre a natureza de nossas alianças. Pois, se é bem verdade que é preciso construir um núcleo com afinidades de esquerda, é preciso buscar a ampliação necessária para sair das cordas.

Nesse sentido, o revolucionário não pode criar ilusões. Do lado de cá - à esquerda do espectro político-partidário - poucas são as siglas que assim podem se considerar. A bem da verdade, mesmo nesse espectro, há as forças políticas cujo compromisso com o Brasil, com o progresso e o desenvolvimento do Estado brasileiro é zero. A esses, o "formato da luta", ou o conforto com seus princípios são elementos mais importantes que enfrentar o verdadeiro inimigo interno e externo. Mesmo nos que se arvoram ser os maiores representantes da esquerda, formas viciadas de fazer política e um conservadorismo sem rumo - do mundo da micropolítica - reina. Além, é claro, dos arrivistas e dos mesmos esquerdistas cuja uma parte fundou outros partidos, mas que outra continua a exigir medidas estreitas como solução para a crise.

Por outro lado, é necessário não criar ilusões com as nossas ampliações, como considerar ser de esquerda aliados táticos cujo pensamento de esquerda passa ao longe. A importância da amplitude e alianças pontuais não nos exige defender e explicar as escolhas feitas pelos aliados. Muito pelo contrário. Tentar demovê-los dos erros políticos é parte da nossa atuação, sem rejeição e sem constrangimentos.

Faz parte da nossa natureza não se perder nos idealismos e ter praticidade tática para poder aplicar o nosso programa e a nossa estratégia em rumo do socialismo. Para isso, é preciso ter frieza e não tomar os aliados como se fossem nós mesmos. Por isso, descortino tático sim, ilusão e dois pesos e duas medidas, não.

terça-feira, 1 de novembro de 2016

O jogo está só 2x2


Tenho usado este espaço repetidas vezes nos últimos tempos para dizer que é preciso "calma, paciência e perseverança", ou que a nossa derrota momentânea - pesada, grande, avassaladora - não é motivo para que cortemos os pulsos e desistamos de lutar por uma sociedade mais justa; muito menos é motivo para colocarmos as nossas experiências na lata do lixo da história. Até porque, vejamos bem, o período republicano no Brasil, e tal qual estivéssemos disputando uma partida, qual seria o placar.

A depender dos "reis do tapetão", nem a República existiria no Brasil. Ainda seríamos governados pela Família Real, enviando, sem nenhum escrúpulo, todas as nossas riquezas direto para Portugal. O fato é que, com muita luta - e acordo também, flexibilidade tática - a República foi instituída no Brasil. Vitória do povo brasileiro, mas dirigida, comandada pelas elites políticas e econômicas do país, que continuaram, nas três primeiras décadas da República, "cozinhando o galo", como diz a linguagem futebolística, dando o tom e relegando a maioria da população a seu plano entreguista e antidemocrático.

O primeiro gol que marcamos, e que eles não aceitam até hoje, veio no período Getúlio Vargas, cuja era FHC prometeu acabar. Lá, foram aprovadas leis e instituídos mecanismos de participação do estado na vida econômica e social do país que fizeram que a elite brasileira nunca aceitasse ser governado por Getúlio. Entre essas conquistas, destaque para a criação da CLT,Petrobras, CSN, CHESF, Vale do Rio Doce, BNDES e Banco do Nordeste. Esse primeiro gol que marcamos no período republicano provocou uma verdadeira ira das elites brasileiras. Tentaram anulá-lo, chamaram os juristas do STJD, mas não conseguiram. Para empatar o jogo, só com o gol impedido conseguiram. Através de um Golpe Militar que levou o jogo a condições completamente adversas. Como se, do lado de cá, para jogar, usássemos vendas e os pés amarrados contra um adversário forte, de artilharia pesada e cheio de fúria contra as conquistas sociais.

A Ditadura chegou ao fim, também com muita luta, mas também muito descortino tático para poder, no colégio eleitoral, derrotá-los. No entanto, apesar da conquista inegável, os rumos do país foram, nos primeiros anos de sua redemocratização, conduzidos pelas forças neoliberais, pelos que queriam, mais uma vez, verem nossas riquezas sendo distribuídas mundo afora.

Nosso desempate tardou, mas não falhou. Após várias bolas na trave, o artilheiro Luis Inácio Lula da Silva conduziu nosso time a mais um golaço na história republicana brasileira. Mudamos o sentido da história brasileira nesses anos; conduzimos o país à mais profunda transformação da história. Levamos negros, pobres, mulheres às universidades; demos dignidade a milhões de brasileiros que saíram da extrema pobreza; passamos a ter altivez nas relações internacionais do país e o artilheiro de nosso time, o Lula, passou a ser reverenciado pelo mundo todo, recebedor de vários títulos Honoris Causa em diversas universidades do mundo. E digo mais: foram 12 anos e quatro eleições de domínio completo do jogo, sem que o adversário chegasse perto de nossa meta, encolhidos, enfraquecidos e moribundos.

É aí que, mais uma vez, tal qual o Fluminense, no tapetão, a elite brasileira - digo, nascida no Brasil - cria regras diferentes, acha a ajuda da TV e do judiciário "desportivo" para novamente empatar o jogo. Mais uma vez empatam o jogo com um gol claramente impedido, de mão e com jogador irregular. Com o poder do Clube dos 13 da política nacional, da imprensa teleguiada e do judiciário venal e corrupto brasileiro, conseguiram, a duras custas, implantar esse golpe, que mais uma vez será revertido pelas forças populares brasileiras.

Mas o jogo ainda está em andamento. O jogo é o jogo da história, e essa não terá fim enquanto houver o time de lá e o time de cá. Por isso, estamos vivos, e jogando. Precisando arrumar a zaga para evitar mais gols do adversário, e precisando arrumar o meio de campo para fazer as devidas ligações de jogo - com o povo, com a classe política, com quem vai decidir em campo - e, obviamente, fazer contratações para ajeitar o time. Por que não? Do lado adversário há os que jogam, e jogam bem. Tirá-los de lá e trazê-los pra cá é um ótimo exemplo de participação ativa na luta e na história. Estamos vivos e jogando, por mais um gol, pelo Brasil.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Contra o esquerdismo de cada dia, calma, paciência e perseverança são atributos revolucionários


A luta de classes, no Brasil e no mundo, não começou ontem. No Brasil, não começou treze anos atrás e, no mundo, vem deixando suas marcas há muitos séculos. Ela, como fruto das contradições entre os possuidores e os despossuídos, tem séculos de existência e um vasto repertório de vitórias e derrotas para ambos os lados.

Para o nosso campo, obviamente, as derrotas são maiores numericamente, afinal de contas, no jogo da história, ainda estamos perdendo, mas nem por isso deixamos e deixaremos de lutar. Imaginem, por exemplo, como deveria ter sido dura a derrota dos jacobinos ao ver o rumo que a Revolução Francesa tomaria. Do fruto da luta daqueles homens e mulheres que viram a grandiosa revolução desaguar num período de terror de estado, monarquia e imperialismo, foram retiradas as lições que influenciaram as ideias socialistas que até os nossos dias nos inspiram.

É preciso pensar no comportamento de Lênin após a fracassada tentativa revolucionária de 1905. Recolhidos da derrota, motivaram-se e reinventaram-se para, doze anos depois, liderar forças e conduzir a Rússia ao maior acontecimento da história mundial no século XX. A Revolução Russa, mais do que uma vitória específica de um país específico, levou os capitalistas mundiais a derrotas profundas, a ter de, obrigatoriamente, garantir conquistas para os trabalhadores do mundo inteiro que, sem a Revolução, nunca teriam sido realizadas.

Lembrem como foi difícil para os comunistas brasileiros, nos seus 94 anos de história, terem seus líderes perseguidos - Prestes, João Amazonas, Maurício Grabois - por tantos governantes diferentes (Getúlio Vargas, Dutra, Militares). Ou como teria sido o baque que os comunistas sofreram ao tomar conhecimento dos documentos secretos do  XX Congresso do PCUS, gerando impacto no movimento comunista em todo o mundo, inclusive aqui no Brasil.

Como seria o Brasil e sua posterior redemocratização se tivéssemos perdido o rumo e desistido da luta após a derrota no Araguaia, ou após a derrota das Diretas Já no parlamento brasileiro? Imaginem se os comunistas no mundo tivessem sucumbido ao decreto neoliberal do fim da história, após a Perestroika e o fim da URSS.

Em todos esses acontecimentos, vários foram os que abandonaram a luta e a crença no destino justo e vitorioso da humanidade. Uns, pela marca do derrotismo, sucumbiram às ideias neoliberais e ao niilismo dos fins do século XX; outros jogaram no lixo o legado que a história do movimento comunista nos colocou diante de 100 anos de luta, rejeitaram unilateralmente as nossas conquistas e sob verniz "de esquerda" passaram a adotar "novos métodos", "novas lutas"; lutas que diziam intensificar o caráter de esquerda, consumidos pelo tão antigo esquerdismo - o esquerdismo que combatera Marx na ocasião da unificação da Alemanha, o esquerdismo que combatera Lênin no início da Revolução, e que combateu Stálin em plena luta contra o nazifascismo.

No entanto, diante de tantas derrotas que a história já nos proporcionou, a bandeira comunista mantém-se firme, com a certeza de que a história, assim como a luta de classes, não acabou com o fim desses episódios. Os que acreditam na superação da sociedade de classes, mantiveram-se firmes e fortes, atualizando-se e reiterando a necessidade da construção de um mundo mais justo.

Em todos esses momentos, um exame minucioso de todas as experiências foram feitos. Alguns repetem o mantra da necessidade de "se reinventar", sem, contudo, reconhecer que é preciso fazê-lo sem perder o rumo, sem perder o sentido estratégico de nossa acumulação de forças e nossos objetivos reais.

No momento da derrota, vários se apegam à forma das lutas. Exigem mudanças de comportamento, posturas que reafirmem "o caráter de esquerda das organizações", e esquecem o conteúdo. Esquecem que o conteúdo das posturas esquerdistas é o conteúdo  contrarrevolucionário, neoliberal, do individualismo, do niilismo e da falta de crença na superação da luta de classes com protagonismo do proletariado, conduzido pelas ideias mais justas. Esquecem que o conteúdo das posturas esquerdistas, é o da falta de qualquer compromisso que não seja com a "sua imagem" e com os seus "princípios", como se a Revolução fosse feita por jogos de cena e pelo "comportamento". Esquecem que o conteúdo dos esquerdistas é o da traição, do abandono aos princípios emancipadores da classe trabalhadora.

Nas horas mais difíceis, cujo destino da humanidade e dos povos estava em jogo, foi a amplitude - e não o contrário - , a calma, a perseverança e o aguçamento do exercício tático que proporcionaram as mais belas viradas da história. Assim fez Lênin em 17; esse era o sentido do pacto Molotov - Ribbentrop na Segunda Guerra; assim os comunistas chineses fizeram para garantir os rumos da Revolução ao  pactuar com Chiang Kai-Shek, assim foi praticado pelos comunistas no Brasil para derrotar os militares no colégio eleitoral. Tudo isso feito, com muita calma, com muita certeza no sentido estratégico das lutas que estavam sendo travadas. 

Diante disso, aos lutadores de agora, é preciso manter essa calma e perseverança necessárias para atravessarmos o vendaval. Ser radical, com o perdão do clichê, é atacar a raiz do problema, sua essência. E no Brasil de hoje, a essência do fenômeno consiste em nos defendermos como forma de, num futuro próximo prepararmos as forças para a retomada do poder político, esse sim, o mais importante instrumento de transformação social. Mais uma vez, com amplitude, sem falsos moralismos e na busca incessante de unir o povo e dividir o inimigo. Só assim será possível mais uma vitória da humanidade, no rumo do socialismo. Por isso, estar vivo já é o suficiente para continuar lutando. Contra o esquerdismo de cada dia, calma, paciência e perseverança são atributos revolucionário.

sábado, 22 de outubro de 2016

Três décadas de social-democracia: e agora?


A redemocratização do Brasil se deu em meio a um período conturbado da história mundial, em seu conjunto. Se aqui passávamos por um estado de exceção, o mundo via sua forma multipolar chegar ao fim, com o fim da Guerra Fria e da União Soviética.

A existência, por si só, da URSS, como já é conhecido, além de ter motivado os golpes militares pelo mundo, sobretudo na América Latina, como forma de manter o domínio estadunidense sobre essa parte do mundo, também serviu como grande inspiração para a luta dos que resistiram ao período da Ditadura Militar no Brasil. Essa luta, até ter chegado no momento de ter-se tornado a luta de uma grande frente ampla pela democracia, teve o sacrifício e protagonismo de forças de esquerda - comunistas e socialistas - que buscavam, entre tantas formas de luta, também, a luta armada - seja no campo, seja na cidade.

A história, até chegar o fim da Ditadura Militar, teve muitas idas e vindas, avanços e recuos das forças democráticas, mas sobretudo, um verdadeiro avanço das lutas populares, que, pouco a pouco foi tirando força e poder dos militares. Estes, como sinalização do fim de seu período, deixaram, fisicamente, ideologicamente e institucionalmente, suas últimas marcas contra as lutas populares: primeiro a chacina da lapa, nos fins da década de 70, depois, no período de anistia e legalização dos partidos, a criação dos partidos social-democratas, entre eles o PT, PSDB E PDT, mas a permanente perseguição aos comunistas e a manutenção até o limite da clandestinidade da sigla comunista.

Em artigo publicado em 1981 na revista Princípios, João Amazonas já alertava sobre a natureza da social-democracia no mundo e sobretudo a que nascia no Brasil. Dizia o dirigente comunista:

"Em várias oportunidades, a social-democracia, por temor à revolução, abriu caminho para o fascismo ou para a direita mais conservadora. Hitler chegou a dominar o Reich graças à covardia da social-democracia alemã, que preferiu o tirano da cruz gamada à frente-única com os comunistas contra o hitlerismo."

Essa social-democracia, que, na Europa, há muito já desembarcara dos ideais de esquerda, embarcava no Brasil, tardiamente - muito pela falta de condições de terem se criado no Brasil, mesmo no período Vargas, quanto no período da Ditadura Militar - com força. Induzida pela classe dominante, como forma de dividir a classe trabalhadora e criar uma ilusão de conciliação de classes, cuja semente já havia sido plantada desde a cisão do partido comunista em 1962. Foi, então, na década de 80, com a criação do PSDB, PDT e PT, que a ideologia social-democrata assume força no Brasil.

Colocar, nas condições do Brasil atual, PSDB, PT e PDT no mesmo "balaio", embora pareça "constrangedor", visto o papel de nova UDN que o PSDB passou a cumprir nos anos subsequentes, não anula as semelhanças sob as quais os partidos foram fundados. 

"Entendam que os trabalhadores não tem só que sobreviver, mas tem que comer bem para continuar produzindo e poderem dar até mais lucros para as empresas", dizia Lula. "A social-democracia não quer acirrar as lutas de classes (...) afirma que a exploração e as desigualdades são superáveis - que uma distribuição mais equilibrada da riqueza é possível e necessária, sem que para isso a luta de classes precise virar uma guerra sangrenta", afirmava FHC.

O papel de UDN, de traidores da pátria e de entreguistas levou o PSDB e FHC à presidência do país, após mais uma enorme crise política - e por que não social - no país, pós impeachment de Collor. Como receita para acabar com a hiperinflação, aceitou-se desnacionalizar quase que por completo a economia do país, vendendo suas principais riquezas e empresas e adotando o mantra do superávit primário como forma de controlar a inflação - com juros altos e câmbio flutuante. Essa receita levou o país a mais uma grave crise econômica e social: altas taxas de desemprego, subserviência ao imperialismo estadunidense, salários baixos e pouca ou nenhuma perspectiva para os brasileiros.

Nesse sentido, a eleição de Lula em 2002 significa, sim uma ruptura, visto que vários dos elementos supracitados foram combatidos, entre eles: a subserviência ao imperialismo, as desigualdades sociais e regionais, além da prática do estado mínimo, conferindo ao estado verdadeiro papel de indutor da economia nacional. Por isso, não podemos passar, a partir desse momento histórico, uma régua e igualar as concepções dos dois períodos de governo - mesmo que sob ideologias social-democratas, sendo que uma sequestrada pela direita e pelo imperialismo, outra levada ao poder pelas forças populares e democráticas do país.

No entanto, como todo bom social-democrata, a conciliação de classes e o pouco sentido estratégico conduziram o PT a praticar uma política econômica híbrida -  se por um lado, ocupava-se em colocar o estado como indutor do desenvolvimento e da distribuição de renda, não mexeu na cota dos rentistas -, transferindo entre 40 e 48%  do orçamento para pagamento de juros da dívida e perpetuando o sagrado tripé macroeconômico de juros elevados, superávit primário e câmbio flutuante. 

Mesmo no período de maior popularidade desse projeto, esquivaram-se de realizar as reformas necessárias, mesmo no marco do capitalismo, entre elas, a reforma política, dos meios de comunicação e tributária.

Esse breve resumo, longe de querer apontar os dedos aos defeitos da força política que conduziu o maior processo de transformação social do Brasil ao longo de sua história, serve, pelo menos aos comunistas, para não criarmos ilusões acerca dos verdadeiros fenômenos e atores que estão à frente do processo de ocupação dos espaços políticos.

A missão revolucionária é árdua e exige de nós verdadeiro cuidado com a nossa própria organização, combatendo os dogmatismos, liberalismos e esquerdismos, a fim de unir as mais amplas camadas do povo em torno de uma transformação verdadeiramente profunda. As transformações da superfície, da aparência dos fenômenos sociais - mais do que tudo o que Marx afirmara ser sólido, "desmancha no ar". 

É assim, nesse país que por décadas rejeita uma revolução e aceita a social-democracia, velha, ultrapassada e recuada, que teremos o papel de conduzir uma revolução, por isso, sem ilusões, mãos à obra!




terça-feira, 4 de outubro de 2016

Aos vencedores, as batatas; aos lutadores, a história!


A magistral obra do escritor realista Machado de Assis, Quincas Borba, conta a história de Rubião, herdeiro do filósofo Quincas Borba, que, entre outras coisas houvera deixado um cachorro e um ensinamento filosófico ao qual a personagem denominava "Humanitismo", traduzida na seguinte frase: "Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas".

O "Humanitismo" que a personagem defendia, consistia, entre outras coisas, na certeza de que o vencedor sempre será o mais forte, ou que, mesmo com uma vitória momentânea, os prêmios, muitas vezes, podem ser apenas mais combustíveis para continuar lutando e/ou vencendo. Ainda conforme Quincas, "a paz, nesse caso, é a destruição, a guerra é a conservação".

O que Machado de Assis, ao criar esse romance, não imaginaria é que o gosto das batatas dos tempos atuais fosse se tornar tão amargo para os vencedores. Afinal de contas, que sabor deverá ter a vitória obtida da forma que os golpistas brasileiros estão tendo neste momento?

Com certeza, o sabor das batatas que os golpistas obtiveram recentemente, pelo menos, deve ser melhor do que o gosto amargo da derrota que as forças de esquerda vem sofrendo desde 2014 no Brasil, apesar de ter conquistado, nas urnas, o direito de conduzir os rumos do país por mais 4 anos, interrompidos de maneira drástica pelas forças mais conservadoras do país.

No entanto, ao sabor amargo da derrota, juntam-se anos de lutas travadas pelas forças progressistas no país. Vitórias e derrotas - mais estas do que aquelas - marcaram a existência das forças que lutam por soberania nacional, antes mesmo do Brasil se tornar uma República, mas sobretudo depois de ter-se tornado e, ainda mais pós Revolução de 30.

Nesse período de República no país, várias foram as gerações que tiveram de resistir a uma maneira brutal de exercício da hegemonia econômica e ideológica praticado pelas forças dirigentes do país. 

Tivemos que conviver com duas ditaduras, com diversas tentativas - e realizações - de golpes, mas que sempre tiveram, mesmo nos momentos mais difíceis, a marca indelével da resistência e da persistência na luta pela democracia e soberania nacional.

Esses lutadores que por aqui passaram, incluindo-se aí todos os que derramaram seu sangue e viram suas vidas desmoronarem, devemos uma atuação tão corajosa quanto. Nos tempos de hoje, acentuados pela intolerância de parte considerável da classe trabalhadora, a resistência deverá ser a nossa maior forma de lutar.

Isso significa que, num período histórico em que houveram pouquíssimos espasmos de democracia no país, cada geração, com sua particularidade soube conduzir a resistência das forças populares e de esquerda do país. Cabe, portanto, a esta geração de militantes, dirigentes e demais lideranças protagonizarem o momento de sua geração e liderar a resistência, retornando a um maior diálogo com a população no geral, sempre no sentido de deslindar a essência dos fenômenos históricos e atuais.

O resultado do primeiro turno das eleições municipais é mais um dado de que o período não será fácil para a esquerda no país, obrigada, agora, além da defensiva estratégica, uma defensiva tática, cujos efeitos ainda serão sentidos a médio prazo.

No entanto, às forças progressistas cabe honrar a luta de todos aqueles que foram e que lutaram para que vivêssemos, mesmo por pouco tempo, períodos de verdadeiras conquistas sociais que não podem ser desmoronadas de uma hora pra outra. Tudo isso precisa ser realizado com ânimo e disposição para a luta, pois a o julgamento da história, este sim é implacável. Diante disso, a primeira atitude deve ser a de não se esconder, de não se envergonhar de tudo o que construímos nesse momento, pois como disse Darcy Ribeiro, "fracassei em tudo na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui. Tentei salvar os índios, não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei. Mas os fracassos são minhas vitórias. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu."